quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Talibã escreveram a Donald Trump


Para não termos informação apenas de um dos “lados”, convém ter em atenção a informação que chega de outras origens. Cada um que analise à sua maneira.

Uma longa carta aberta dos Talibã já deve ter chegado às mãos do Presidente norte-americano. É um texto, com data de 15 de Agosto, em que o “Emirado Islâmico do Afeganistão” lembra Donald Trump de que após 16 anos de guerra, o Afeganistão está pior, os militares norte-americanos continuam a morrer e o país é governado por políticos corruptos apenas interessados nos seus próprios negócios.

O texto acusa as lideranças militares de mentirem e de fazerem chegar informação errada a Donald Trump, relativamente à situação no terreno, e acrescenta que os afegãos podem contar muito facilmente os caixões que diariamente são enviados para os Estados Unidos. Quanto aos supostos aliados políticos (governantes afegãos) dos Estados Unidos são acusados de enviar informação deturpada e de alguns deles, em simultâneo, estarem envolvidos em negócios com países. É o caso do General Abdul Rashid Dostum, um homem que já lutou em todas as barricadas (contra e a favor da União Soviética), fez parte da Aliança do Norte, esteve várias vezes exilado fora do Afeganistão e é o que habitualmente se designa por um “senhor da guerra”. Actualmente é Vice-presidente do Afeganistão. Os Talibã acusam-no de estar a construir uma aliança, fora do Afeganistão, para combater o Presidente Ashraf Ghani.

Em cerca de duas dezenas de parágrafos, o “Emirado Islâmico do Afeganistão” (Talibã), Donald Trump é desafiado a não cometer os erros dos seus antecessores e lembra Trump que os Talibã fizeram aos Estados Unidos o “maior favor internacional”: livraram os Estados Unidos e o Mundo da “praga comunista” (alusão à guerra que obrigou a União Soviética, em 1989, a retirar do Afeganistão). É perante este facto (que os Talibã dizem ter sido um “favor histórico” aos Estados Unidos) que o “Emirado Islâmico do Afeganistão” pergunta a Donald Trump se a recompensa é sujeitar os afegãos a serem governados por políticos criminosos, corruptos, imorais e incompetentes.

Na carta é feita a exigência de que os afegãos sejam tratados com generosidade, em pé de igualdade com os seus interlocutores, e não através de invasões e guerras que terminaram sempre com a derrota das potências invasoras. “Cemitério dos Impérios”, como frequentemente é lembrado, o Afeganistão já viu caírem por terra as intenções de britânicos, soviéticos e... os Estados Unidos já perceberam há muito que não vão vencer guerra nenhuma no país onde inicialmente apoiaram os Talibã contra a União Soviética. Os Talibã lembram a Donald Trump que não estão a fazer guerra por procuração, dizem que não recebem qualquer apoio externo e desafiam os Estados Unidos a provar que isso esteja a acontecer.

A carta termina com um apelo: a juventude norte-americana não nasceu para morrer nas montanhas e desertos do Afeganistão nem para ir matar civis num país tão distante dos Estados Unidos; Foi um erro histórico (dizem) ter enviado a juventude norte-americana para o Afeganistão e um “Presidente responsável” deve corrigir erros e evitar a morte de militares norte-americanos no Afeganistão.

Donald Trump é ainda convidado a ficar na história como um defensor da paz, que não deixa as questões da guerra apenas nas mãos dos militares que têm interesses próprios para manter essa guerra.

A questão da guerra é colocada de forma muito directa (tradução livre): “No Afeganistão, cada pai ensina aos filhos a emancipação do país em relação aos invasores. Num país onde cada criança é criada com um espírito de vingança e detém a honra histórica de derrotar três impérios antes da invasão dos Estados Unidos, como conseguirão os norte-americanos uma situação estável para uma presença permanente? Todos percebem que o principal motor da guerra no Afeganistão é a ocupação estrangeira”.

Os Talibã lembram a Donald Trump que, após 16 anos, com militares profissionais e experientes dos Estados Unidos e da NATO, com alta tecnologia e recursos económicos, não venceu esta guerra; e que também não irá vencer recorrendo a mercenários. A carta pede ao Presidente norte-americano que analise a realidade de “coração aberto” e tome decisões responsáveis.


Falta agora saber se haverá resposta de Donald Trump.


NOTAS:
1 - Portugal tem 10 militares integrados na Força NATO (RSM – Resolute Suport Mission) e 2 militares ao serviço da ONU (United Nations Assistance Mission in Afghanistan), no Afeganistão; dois militares portugueses morreram no Afeganistão quando estavam integrados na ISAF (International Security Assistance Force) - Primeiro-Sargento Comando João Paulo Roma Pereira (2005) e Soldado Paraquedista Sérgio Miguel Vidal Oliveira Pedrosa (2007).

2 – Os Estados Unidos anunciaram em Junho o envio de (mais) cerca de 4 mil soldados para o Afeganistão; desde 2001 morreram no Afeganistão cerca de 2.400 militares norte-americanos.

Pinhal Novo, 15 de Agosto de 2017
josé manuel rosendo

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